Mãe, você nunca mais será amada dessa forma...



Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

Leia mais uma vez. Deixe a frase ancorar, fazer sentido.

Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

A incessante necessidade do toque, do contato físico. Acaba. O constante chamar, o querer dividir todas as mais simples, minúsculas coisas: "Olha o que eu consigo fazer, mamãe!". Acaba.

Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

O cobrir todas as noites antes de dormir, os pezinhos que te escalam durante as refeições, os beijos molhados pós-banho. Isso acaba.

Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

Os pulos na sua cama, o corpo que vira pista de carrinho, os giros de dança que bagunçam o tapete da sala, o pentear dos cabelos úmidos. Acaba.

Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

Os sanduíches às sete da manhã̃ de domingo, os desenhos debaixo das cobertas, o abraço na madrugada após um pesadelo, o contar histórias. Acaba.

Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

Esse amor, a vontade de estar tão perto que às vezes nos sufoca. Acaba.

Você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

A verdade é que quando os filhos são assim, pequenos, é a fase da vida em que nossa adoração é quase que recíproca. Mas passa. Eles crescem e cresce a necessidade de viver outras histórias, outras pessoas, outros sonhos.

É a lei da vida, o caminho certo, é saudável. Mas ainda assim, mesmo sabendo que criar asas é um dos atos mais lindos da maternidade, ver voar é um “doce amargo”.

Será́ sempre a alegria mais estranha que já se ouviu falar. Uma felicidade diferente que, ao chegar, forma buracos. Um misto de vazio com a sensação de missão cumprida.

Ver voar é aplaudir cada conquista, mas ainda querer sentir as mãozinhas pequenas que te agarravam pelas pernas. É se orgulhar, apoiar, mas com um eterno gostinho de saudade. Saudade do tempo que passou.

Saudade de ter os filhos sempre ao alcance dos olhos. E acima de tudo, saudade dessa fase. Desse amor. Esse que você̂ tem agora, tão próximo, palpável, bem aí ao seu lado.

Por isso, quando o chamar, o tocar, o pedir, quando tudo estiver te levando à beira de um colapso nervoso, lembre-se: você̂ nunca mais será́ amada dessa forma.

Fonte: Texto retirado do livro 60 Dias de Neblina de Rafaela Carvalho